segunda-feira, 2 de julho de 2012

 
A  partir de hoje vou tentar apresentar-vos alguns clientes da OASIS. A sua chegada à minha rua é perfeitamente aleatória. Não quero limitar-me a mostrar-vos a sua fotografia, mas acrescentar uma legenda de acordo com as emoções que despertou em mim.

A legenda da sua fotografia requer algum esforço da vossa parte, mas acho que só, assim, a podem compreender. Então  leiam o poema: “A flor” de Almada Negreiros
“Pede-se a uma criança: Desenhe uma flor! Dá-se-lhe papel e lápis. A criança vai sentar-se no outro canto da sala onde não há mais ninguém. Passado algum tempo o papel está cheio de linhas. Umas numa direcção, outras noutras; umas mais carregadas, outras mais leves; umas mais fáceis, outras mais custosas. A criança quis tanta força em certas linhas que o papel quase não resistiu.
Outras eram tão delicadas que apenas o peso do lápis já era demais.
Depois a criança vem mostrar essas linhas às pessoas: Uma flor!
Contudo, a palavra flor andou por dentro da criança, da cabeça para o coração e do coração para a cabeça, à procura das linhas com que se faz uma flor, e a criança pôs no papel algumas dessas linhas, ou todas. Talvez as tivesse posto fora dos seus lugares, mas, são aquelas as linhas com que Deus faz uma flor!”
Agora já vão entender o que vou dizer: escrevi uma
CARTA  A  ALMADA NEGREIROS

Mestre Almada,

Porque quero tão só, emprestar alguma beleza a uma situação deveras injusta, tentei pôr em prática o seu poema: “A Flor”. Que lindo que ele é! Sempre me encantou e sempre achei que poderia ter a ver com a diferença. E, tem. Repare...
Um dia conheci, uma menina de olhos e cabelos castanhos, riso fácil e simpático, portadora de paralisia cerebral, mas penso que feliz, porque muito acarinhada e muito querida.
Em certa ocasião, dei-lhe um livro grande, uma esferográfica e um lápis para ela fazer desenhos. Desculpem lá, mas um livro é um livro, muito mais estável e condizente com o estatuto de mulherzinha do que uma simples folha de papel.
   Abre-o, desfolha-o e, como gente grande, escreve no seu livro. Ri... ri muito e é um regalo vê-la tão entusiasmada!
     Em tardes de Domingo, quentes e pachorrentas, gosto de me sentar ao pé dela, desenhar flores nesse livro e pedir-lhe:
         - Vá, faz uma flor! Pode ser um girassol.
A menina rabisca, rabisca de baixo para cima, de cima para baixo, para os lados e quando acaba o desenho, olha para mim e ri-se. Nesse exacto momento, tenho a certeza de que aqueles rabiscos são  as mesmas linhas com que Deus faz uma flor.



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